Há quem diga que antropólogo é
arrogante, agressivo. Que não respeita a interdisciplinaridade, que é muito
acadêmico, que não é objetivo, que se apega muito aos detalhes, que não sabe
conviver com pessoas “inteligentes”.
Populações que moram as margens
do rio, conhecidos popularmente como ribeirinhos e indígenas. É com essas
pessoas com quem você vai conviver,
conversar, comer e esmagá-las de perguntas agressivas e questionários absurdos
num intervalo de poucas horas.
Questionário? quem ainda usa isso? Escola de
Chicago revival! Uma breve leitura de um dos capítulos do livro “a miséria do mundo” resolveria o problema. melhor não, os formulários já foram
impressos, as tintas e os papéis já foram gastos. Sugestões também não serão
aceitas... pra que mudar uma fórmula que já vem dando tão certo?
E aí começa a feira de vaidades.
Ouvi uma vez que a geografia é a ciência do poder, na guerra, ela era-é
fundamental. Na Amazônia também. Você não tem noção do que é esse mundo
paralelo de rios, florestas e demarcações até ter condições de pegar uma rabeta
e se dirigir sozinho à casa do seu parente mais próximo. Não tem placa, não tem
sinal de “vire a esquerda” ou siga a seta, não tem faixa de pedestre, as
localidades não aparecem no mapinha de colégio que você trouxe ingenuamente
achando que ia identificar tudo. E aí começa a peregrinação com as imagens
congeladas do google earth, seus mapas desenhados artesanalmente rabiscos
de rios e o maravilhoso GPS, pra entender a dinâmica desse mundaréu de coisa.
Apesar da paisagem ser
paradisíaca, turismo por aqui é "pesca e caça esportiva”. Sim, o
esporte favorito da rainha da Inglaterra rola por aqui. Não sei se na Europa
eles atiram nos “camponeses” sem querer, aqui acontece vez ou outra. mas e daí?
Não pretendo fazer análises sobre
um trabalho que estou escrevendo “relatório”, que provavelmente não será lido.
Gostaria de retornar ao tópico “a arrogância antropológica”:
Experimente conviver com ambientalistas
que admiram a postura de fazendeiros no entorno da BR 319 e criticam os
preguiçosos índios que atrapalham o progresso. experimente também, ouvir que a
comida da população, CUJO INTRUSO É VOCÊ, é um lixo. Experimente, dentre outras
coisas, ouvir que pessoas que foram absurdamente espoliadas, que não conseguem
nem dizer bom dia na sua língua materna por vergonha ou por não ter sido ensinado, ou (...), é vigarista e
oportunista. Experimente ainda, acompanhar o
descaso e a insensibilidade de pessoas experientes no “meio ambiente” ignorar
as angústias, a complexidade, os jogos de poder e a história de todos aqueles
que viveram-vivem reféns das ações atropeladas do governo federal e dos
próprios coronéis de barranco e regatões que insistem em existir. Eles não
morreram nos livros. O patrão agora é outro.
o dono do mercadinho que generosamente
“faz fiado”.
O kilo do feijão custa 8 reais
por aqui, sem os juros do "empréstimo", faça as contas.
Aparentemente, dentre os
“diplomados”, pouco se sabe do massacre que acontece com os Guarani no mato grosso, sim minha gente, tente dormir sabendo que famílias inteiras
estão morrendo pra viver num pedaço de terra DEBAIXO DO SEU NARIZ. Mas isso é
bobagem, a mídia tá pouco se lixando pra esse etnocídio, queremos saber como
vive a família do “terrorista_imigrante_do oriente médio” dos EUA, esses sim
são malvados.
(...)
Dentre as pérolas que você vai
ouvir: “não tem morador, só índio”. Calma, não pule do barco.
Se você consegue ficar calado,
por favor, me dê a pílula. Tenho receio de não fazer amigos e ser
convidada a me retirar o quanto antes. Desenvolver máscaras sociais,
representar o eu na vida cotidiana E treinar o discurso pra mandar tomar no cú
com elegância acadêmica faz parte dessa rica experiência.
No salão de
festas do barco, com ar refrigerado, depois de um jantar de muito requinte, com taças e louças brancas.
23.04.2013 - 22:52
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