terça-feira, 21 de setembro de 2021

As franjas do mar e a linha azul

Ontem conheci uma mulher.

Logo de cara senti que seríamos amigas. Hoje senti mais forte. As relações sem esforço são impressionantes. Espero lembrar disso quando me sentir desconfortável com alguém. 

Para encontrá-la, precisei pegar o metrô e passar por dez estações da linha azul. Dá uns dezessete minutos. 

Na última estação (ou na primeira) fiquei na dúvida em qual saída sairia, acho que são três. Resolvi perguntar:


Estação Jabaquara, linha azul do metrô de SP (21.09.21)

De acordo com o endereço, eu deveria sair pela Av. Engenheiro Armando, dobrar a esquerda e pegar um ônibus. 

Saindo da estação, duas coisas mudaram a minha forma de pensar a cidade e algumas possibilidades de mobilidade. Tipo aquela ideia de "revelação" do Rubens Alves que eu já contei milhões de vezes pra todo mundo que eu conheço, inclusive por aqui... ou no outro. Acho que no outro. 

A primeira coisa foi a voz de um homem em pé, aos berros:

- Praia, praia, praia, sai agora! 

O céu estava azul, sol no talo sem nuvens, do jeito que eu gosto. Meus ouvidos foram tomados pelos gritos e meus olhos grudaram numa árvore linda, cor de rosa. No meio desse transe, um avião passou estridente, quase por cima das nossas cabeças. 

EU AMEI TUDO, TUDO MUDOU.

linha azul - metrô de são paulo
Linha azul do metrô

Senti uma vontade tão grande de viajar, me imaginei sentadinha naquela poltrona de avião, cheia de vontade de chegar em sabe-se lá onde. 

Enquanto esperava o ônibus, por dez minutos, passaram mais três gigantes tirando fino... que fluxo intenso! Imaginei que estaria próxima do aeroporto de Congonhas. Guarulhos certamente estaria do outro lado, quer dizer... haahaha deixa eu ver. (...) ACERTEI! rs

Fiquei pensando na resposta que o rapaz me deu na saída do metrô... cinquenta minutos. Eu estou à cinquenta minutos de distância do mar. 

Dá pra acreditar?

Infinitas possibilidades se aproximam. 

domingo, 19 de setembro de 2021

o brasil que deu certo, 34

"hay que caminar para conocer."

outro dia explico quem me disse essa frase. 

saí decidida a conhecer meu entorno, meu país. não pedi orientação de ninguém, nada. fui sentir o movimento, a cidade, o meu balanço.

continuei a caminhar entre aqueles prédios antigos. as ruas seguiam com lixo, cinza, até que um nome me chama atenção: arcadas. 

além do outro significado mais endurecido, diz respeito ao formato das janelas, um conjunto delas.

segui caminhando, atenta a qualquer movimento que me pedisse pra ficar.

prainha da praça, dizia. era gostosa a sugestão. é um clarão bem no meio daquele emaranhado de concreto armado sem muita relevância. fui corrigida: "aqui é a bolsa de valores de são paulo". 

ainda desconfio, mas ele disse que é. 

parei e comecei a ouvir os tambores. foi o primeiro batuque que ouvi depois de todos esses milhares de anos. 

foi lindo acompanhar aquela força, aquele som poderoso e imponente vindo do meio daqueles prédios sujos, abandonados, esquecidos, largados ali. poderia falar sobre os louros da "decadência", mas não vou. passado um tempo, não havia mais prédio algum, só a força das mãos, o couro esticado e os sons. os monumentos diminuíram de tamanho e houve uma combinação de corpos pouco comum naquele centro tão carregado de histórias mal contadas sobre desenvolvimento econômico, o famoso "sucesso sulista". 

são novas memórias, novas históricas, pensei. novas maneira de contar, talvez. 

eu cresci junto... e quanto mais perto, mais potente, mais forte. quanto poder. não por a caso, é com essa mesma frequência que os orixás descem à terra, é um convite. 

encontrei um lugar.  

viva. bem viva. 









quarta-feira, 15 de setembro de 2021

O ralo da pia


Ontem a pia da cozinha entupiu. 

Aquela rodinha pequena, um emaranhado de fios de aço que não deixa os restos de qualquer coisa passar, foi esquecida durante o tempo que habito por aqui. 

Não imaginei que seria tão grave.

Mandei essa foto para o grupo da família e meu pai me ligou quase imediatamente:

- Oi, filha. Está com problemas domésticos? (risos). Você vai precisar abrir o cano embaixo da pia e tirar o que tiver atrapalhando a água passar;

- Pai, aqueles ácidos, tipo diabo verde, não adianta? Vou precisar colocar a mão nisso? não quero.

- Vai, não tem jeito. 

A pia passou da manhã até o fim de tarde assim, com essa água parada, suja e com alguns restos de sabe-se lá o que boiando. Com o tempo quase sincronizado ao entupimento da pia, tive que ensaiar um pedido de desculpas. 

Antes tarde do que mais tarde.

A sensação de soco no estomago que nunca tomei, passou alguns dias me perseguindo. A garganta e o cano entalados marcaram a importância daquela peça simples, barata e tão fundamental: o ralo.

Assim que desliguei o telefone e ter sido premiada pelo maior vexame do mundo, minha mãe me ligou na sequencia para explicar como desentupir o cano. Não deu tempo de respirar nem processar a ressaca moral. 

- Filha, coloca uma bacia embaixo da pia para não ter risco de molhar tudo. Se você estiver com nojo (risos) calça as luvas de borracha. Assim que a água toda sair, joga na pia do banheiro e procura identificar o que pode estar ali dentro. Tira tudo. Ainda bem que estava no sifão, quando o entupimento é mais dentro do cano tem que quebrar a parede. Usa sempre a tela de proteção da pia. E nunca tentar empurrar resíduos dentro do cano. 

Quando a água inteira escorreu, guardei as panelas, fechei as portas, lavei a pia e algumas coisas que estavam por ali. Olhei pro ralo e chorei. 




textos relacionados

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...