quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

redes, barcos e intelectuais de meia tigela

Hoje vou escrever sobre sobre a possibilidade de cura deste mal que corrói a alma: a preguiça.

Não falarei de uma cura stricto, proponho uma cura lato, qual seja, a preguiça de ler e escrever... as demais, cultive-as, chega um momento de nossas vidas que é só o que temos. 

Deusulivre de perder a sua priguicinha gostosa diária, tenho certeza que é lá que mora a felicidade, bem vizinha do ócio. 

"fulano passou o dia coçando o saco", essa frase é hipotética e cabe nas classificações hostis sobre alguém... mas de uma coisa tenha certeza, independente de quem seja fulano, ele é um cara de sorte e feliz. 

No entanto, como você é uma pessoa de ambições infinitas, que não aceita ser sucursal (essa palavra aprendi hoje) saiba que é possível driblar uma das espécies de preguiça que mais tem gerado transtornos na sua vida ultimamente: a preguiça de ler e escrever.

Diante dos primeiros sintomas, arrume uma mochila, separe aqueles livros que você julga importante, mas por favor, tenha critérios. 

lembre-se de costurar a alça e alguns bolsos da sua

Separe poucas mudas de roupa, eu disse POUCAS. aquela frescurada gostosa de tomar banho pra você nunca esquecer que é uma diva em qualquer circunstância... os remedinhos salva-vidas, seus óculos, o caderninho verde limão (o menor), vulgo diário, alguns lápis e canetas.

Munida deste equipamento de guerra contra esta doença que está atrapalhando sua vida, vá a "Manaus Moderna", aquele espaço fantástico que você viciou e encasquetou (é lá que tudo acontece!!!) e compre suas passagens de barco recreio com destinho "Manaus - qualquer lugar". O importante é você se manter sobre o rio Amazonas. 

Empresa: golfinho do mar II, volta de Santarém, rio Amazonas, jan. 2014.

É impressionante a quantidade de coisas que você irá ler no fundo daquela rede!

dormir. acordar. ler. dormir. acordar. ler. dormir. tirar fotos. ler. conversar. escrever. ler. dormir. comer. tomar banho. ler. dormir. ler. dormir. ler. dormir. escrever. ler. dormir. comer. comer. dormir. ler. dormir.

Em menos de um mês, nesse ritmo, você destrói e constrói o mundo, revisa toda a bibliografia do seu mestrado, escreve e pensa sobre mil tipos de pegações e sacanagens, cultiva os pensamentos mais promíscuos à serem realizados num futuro próximo (favor levar um livro BOM com essa finalidade) e com otimismo, você até rascunha o projeto do seu doutorado!

Você irá se tornar uma intelectual das águas, nenhuma novidade no mundo antropológico, Koch Grunberg, Alexandre Rodrigues Ferreira, Ermanno Stradelli, Curt Nimuendajú (...) morreriam de orgulho... é puro luxo você se aproximar dos "modos de fazer" dos primeiros viajantes e da etnologia clássica, um charme só!

Tire auto retrato lendo naquele mosaico apaixonante de cores e tecidos e publique nas redes sociais, sucesso total!

Empresa: Amazon Star, ida para Santarém, dez, 2013.
"dica para se tornar popular no instagram e demais redes sociais" 

O barco não te isola do mundo, ele te proporciona uma outra experiência que eu não sei explicar. um barco não é uma ilha, nem uma biblioteca... e toda aquela paisagem móvel de barrancos, boizinhos, casinhas, cerquinhas, árvores, canteiros, plantações de macaxeiras, mandiocas, bananas, telhados de zinco, de palha,  telhados coloridos, açaizeiros caneludos, antenas parabólicas, caixas d'água, carcaças de canoas, milharais, malhadeiras, varandas e girais que multiplicam vidas, varal de roupas coloridas que enfeitam as casinhas distantes lembrando as amadas e memoráveis festas juninas na sua casa, boi preto, boi branco, boi marrom, podem ser vacas... o barquinho  tá rápido e não consigo ver os chifres (UFA! antes vaca do que boi), igrejas, escolas, postes, fios de alta tensão, campinhos de futebol, uma moça que varre a varanda, o banheiro separado da casa, os meninos e meninas que pulam no furo/igarapé, o homem vestido de azul que monta o cavalo e guia os bois, a mulher que saiu da roça com uma bacia vermelha nas mãos, a árvore caída no barranco, o barquinho lotado cheio sorrisos, redes e mãos acenando... os pássaros brancos, pretos, amarelos, coloridos que voam na altura da sua rede... ai, ai, ai.

rio Amazonas, janeiro, 2014


Toda essa paisagem móvel, vista do fundo da sua rede, te convida a pensar sobre esse outro planeta, que durante muito tempo você o ignorou, sabe-se lá porque.

Aguarde, arrume e segure a munição... não atire agora, foco na dissertação.


Sugiro as agencias que fomentam pesquisas no país, CNPq, FAPEAM, CAPES, Fundação Ford (...) a viabilizar recursos aos pesquisadores que estão em treinamento, vulgo, pobres pós-graduandos sedentos por viagens de barco... a fim de concluir suas dissertações, falo muitíssimo sério.



"Façam alguma coisa na vida de vocês! peguem um avião, vão pra Iquitos, desçam até Manaus de barco, façam algo! escrevam! não entendo qual o problema de vocês, tem pouca leitura! nenhuma visão crítica de nada! ao menos vão viajar, conheçam alguma coisa!"

então tá né?

Presente do fim do dia:

rio Negro, janeiro, 2014


É muito difícil não comprometer o olhar pelo tamanho desse rio,
por esse(s) por do sol mais lindo do mundo...


amazonas moreno, raízes caboclas.






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