terça-feira, 4 de novembro de 2014

Ver-o-peso e outras comidinhas

O parente desmemoriado de Manuel de Borba Gato ao pisar em solo Paraense, deixou de lado a cobiça por ouro e esmeraldas imposta por seus ancestrais, e espalhou aos quatro ventos que queria experimentar o melhor Açaí da região. Ouviu falar de uma rixa antiga entre Manaus e Belém e foi tirar a prova deste sabor nas mediações da rodoviária principal da cidade.

Açaí fresco com farinha de tapioca, Belém, 2014.


Ao experimentar o delicioso vinho de Açaí, decidiu guardar à sete chaves o resultado do método comparativo nesta refinada empreitada degustativa para não ferir o coração de ninguém, seu amigo Vladimir Maiakovski  havia feito um bom trabalho neste jovem rapaz. 

Ao andar desnorteado atrás de algum lugar que lhe oferecesse peixe frito ainda próximo à rodoviária, teve uma nítida lembrança de uma professora de literatura, Nicia Zucolo, falando sobre uma ilha à duas horas de distância do centro da cidade... : "eu moraria em Algodoal... amo!" 

Guardou na memória este nome, aproveitou que tinha algumas moedas no bolso e correu para a casa das onze janelas em busca do seu peixe frito, Luma sugeriu Filhote.

Casa das onze janelas.

Uma de suas melhores lembranças vinham deste lugar, foi lá onde dançou carimbó no encerramento da 27a Reunião Brasileira de Antropologia (2010) até o seu último suspiro! Apesar do barulho ensurdecedor que vinha do bar palafitas, sentou de frente para o Rio e foi observar o cardápio como quem não quer nada... achou os preços caríssimos, mas sem pestanejar, pediu o tal do Filhote. Com as poucas moedas douradas no bolso sabia que conseguiria pagar o prato. Novamente pensou no seu método comparativo e fez uma aproximação entre o tambaqui e o pirarucu... não ousou dizer uma só palavra. Os sabores das três espécies o deixava cada vez mais desnorteado e entusiasmado com aquela região.

Quis conferir o tamanho do "Peixe Filhote" e correu no Ver-o-Peso.

Foto: Dorival Moreira, Mercado Ver-o-Peso

Chegando lá, percebeu que sua pressão baixou e quase sofreu um desmaio... era o calor. Não estava acostumado com o sol generoso daquela região... parou em um dos botecos do mercado e pediu uma Cerpa gelada. Aquilo sim era cerveja!

No meio de uma observação atenta ao Rio que estava a sua frente, presenciou uma cena que jamais esquecerá, esqueceu a busca ao Filhote e tirou o caderninho do bolso, um lápis quase sem ponta e sussurrou para si mesmo:  Neste exato momento Bukowski sente inveja de mim.

Mercado ver-o-peso, 2014. Obs: estas pessoas foram consultadas
quanto a utilização das fotos, no entanto, decidi não citar seus nomes.
O descendente de bandeirantes percebeu que ao lado de sua mesa, havia um casal que conversava inebriadamente, deixando a nítida impressão de desejo um pelo outro, coisa que jamais vira em lugar algum. Na falta do que fazer, passou a observar o casal com interesse e atenção. Notou que o rapaz, ao tentar seduzir a moça comprando para ela alguns pares de calcinha rendada nas cores preta e vermelha oferecidas por uma gentil senhora que passava vendendo perfumes e peças íntimas entre os frequentadores do bar-mercado, foi interrompido por um terceiro personagem: o romântico tatuado. Tendo em vista travar um duelo com o comprador de calcinhas e laçar o coração desta mulher que despertou o desejo de ambos, tentou neutralizar a compra das peças rendadas oferecendo nada menos que a eternidade ou até o fim de sua própria existência: a própria pele com o nome da amada... 

No exato momento em que os olhos da mulher amada se cruzaram com o olhar romântico do jovem tatuado, a vigilância sanitária cercou o espaço e grotescamente retirou o tatuador de cena o acusando de falta de higiene na sua prática de trabalho. Ele refutou as acusações dizendo que usava luvas descartáveis e máscara cirúrgica. Foi "advertido" pela figura do Estado opressor sem entender absolutamente nada daquelas acusações.

O neto de Borba Gato aproveitou a deixa, pagou as duas cerpinhas geladas e correu rumo à rodoviária. À tempo, pegou uma Van (não vá de ônibus), atravessou Belém e em duas horas chegou nos limites de Marudá. 


Trajeto de Belém a Marudá.

Agora faltava pouco, mais uns 30 minutos e estaria na Ilha de Algodoal. 





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